SUPREMO “NORMATIZA” CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL PARA SERVIDORES PÚBLICOS. MAS, E, NA PRÁTICA, O QUE MUDOU?

Por João Santana Filho.

A Constituição Federal garantiu ao servidor público o direito à aposentadoria especial, mas, no entanto, ainda não foi editada lei complementar definindo os critérios para a concessão dessa modalidade de aposentadoria. A isso, dá-se o nome de lacuna legislativa. Prejudicados por essa mora legislativa, milhares de servidores ajuizaram ações visando à obtenção do direito que lhes foi garantido pela Constituição. Os tribunais de todo o país foram, então, recebendo uma enxurrada de processos que foram parar no Supremo Tribunal Federal para dar a “ultima palavra”. Foi por isso que o Ministro Gilmar Mendes propôs e obteve do STF a aprovação da Súmula Vinculante 33: “Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do Regime Geral de Previdência Social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, parágrafo 4º, inciso III, da Constituição Federal, até edição de lei complementar específica.” Convém destacar que essa Súmula Vinculante 33, do STF, abrange também os servidores públicos estaduais e municipais que não ainda tenham normas próprias regulando a aposentadoria especial. Com isso, os requisitos para a aposentadoria especial dos servidores públicos, submetidos a atividades que prejudiquem a saúde ou a integridade física passaram a obedecer aos critérios já previstos para os empregados de empresas privadas na Lei 8.213/91, até que o Congresso aprove lei complementar específica para os servidores públicos, dando muletas à Constituição, neste particular até hoje tetraplégica. A edição da SV 33 pelo STF visou a evitar que milhares de servidores públicos continuem ajuizando ações individuais para obter tratamento idêntico aos celetistas. No caso do servidor público exercer suas atividades em condições insalubres, poderá a partir de agora requerer aposentadoria especial e a Administração Pública deverá analisar o requerimento com base nos requisitos do Regulamento Geral da Previdência Social e terão direito de se aposentar com menos tempo de contribuição que os demais agentes públicos. Assim, se o servidor público tiver trabalhado durante 25 anos sob condições insalubres, terá direito à aposentadoria especial. Porém, o Governo está entendendo que quando a SV 33 se utilizou da expressão “no que couber”, quis dizer que não são todas as normas aplicáveis aos celetistas que serão cabíveis para servidor público. Detalhe grave: não aplica para os servidores públicos a regra da CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM TEMPO COMUM. Significa dizer que o trabalhador da iniciativa privada pode somar o tempo da atividade normal com aquele reduzido em razão de condições insalubres ou perigosas e que já o servidor público não pode gozar desse critério porque o STF afirmou que a Constituição não obriga a edição de lei em favor dos servidores públicos, prevendo contagem diferenciada para quem trabalhou parte do tempo em atividades prejudiciais à sua saúde. Essa interpretação vesga dos operadores do direito, a nosso ver, não faz qualquer sentido, porque restringe violentamente a aposentadoria mais cedo daqueles trabalhadores que exerceram atividades insalubres/perigosas por períodos menores, desprezando, portanto, os efeitos negativos sobre a sua saúde nesses períodos. sendo justo a sua apreciação diferenciada, proporcionalmente ao tempo em houve a exposição aos agentes prejudiciais. A negativa de redução de tempo proporcional e a sua proibição de somá-lo ao tempo comum é uma afronta a isonomia tão marcante na Constituição. A SV33 determinou a adoção das regras do RGPS para os servidores públicos para beneficia-los, não podendo o operador do direito restringir a sua aplicação para prejudica-los. Outro aspecto negativo, além de não se aplicar para os servidores públicos as regras de conversão do tempo especial em tempo comum previstas para os celetistas, está na interpretação dos técnicos do Governo que a concessão da aposentadoria especial retira do servidor beneficiado o direito à paridade remuneratória em relação aos servidores em atividade. Se o servidor se aposenta pela regra especial à ela deve passar a ser vinculado. Diante desse risco de “desproteção” do poder aquisitivo dos proventos, pede-se muita cautela por enquanto, devendo os servidores públicos buscar orientação jurídica em seus sindicatos para que não sejam surpreendidos com dissabores de optar por uma norma que na prática pode ser a aplicação do famoso jargão popular: “dar com uma mão e tirar com a outra.”

João Santana Filho, advogado, especialista em Direito Público, é sócio-administrador do escritório Santana, Araújo & Costa – Soluções Jurídicas Aplicadas.

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